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Fruto duma boa noite
de amor e gemido.
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Criado por meus pais
entre o mar e o paralelepípedo.
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Tenho certeza:
— Não pedi para vir ao mundo.
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Sendo assim não preciso
concordar com o que encontrei.
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Fruto duma boa noite
de amor e gemido.
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Criado por meus pais
entre o mar e o paralelepípedo.
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Tenho certeza:
— Não pedi para vir ao mundo.
.
Sendo assim não preciso
concordar com o que encontrei.
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para Lili e Amanda Proeti
Fátima e Maria Júlia,
Cristina Roseno e Anabela,
Ana e Lira,
Sheila e Natasha
e todas as mulheres em luta
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Nestes dias
como há milênios
é imprescindível afirmar
a humanidade
Do ser humano mulher.
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Reconhecer-lhes
o título de propriedade
de seu corpo
registrado alguns milhões de vezes
no cartório de seu cariótipo.
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Nestes dias pós-modernos
de áurea tão medieval
se faz necessário
Ressignificar a lei do ventre livre.
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para Edison Júnior, Danilo e Beatriz
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I
na quebrada
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CHUMBO!
CHUMBO!
CHUMBO!
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do bom e do grosso
com casca e caroço
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a granel
no atacado
.II
II
aos donos das balas
no lombo do preto
nas fuças do pobre
a salva de prata
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A FUNÇÃO DA ARTE – 1
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Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o Sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto o seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:
— Me ajuda a olhar!
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texto extraído de O livro dos abraços.
Porto Alegre: L&PM, 2008
Tradução: Eric Nepomuceno
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o poema
tem vezes
é essa prisão
de ventre
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e quando sai
sangra
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