I
Aurora
eu te diviso
ainda tímida
inexperiente
.
das luzes
que vais acender
.
dos bens
que repartirás
com todos os homens
.
– Prenunciou o poeta gauche
em seu sentimento do mundo
.
Antes
muito antes
de nascer
Aurora.
.
.
II
Quando telefonava
clandestina
para encontros
clandestinos
identificava-se
.
Luíza Porto
.
Lola era afável
.
posto que estrábica
muito levemente estrábica
atirava bem
Muito bem
.
até que um dia
não ligou nunca mais.
.
Acabou a poesia.
.
.
III
Há que
haver sobrado
alguma poesia
.
Há que
haver
pelo menos
a certeza poética
emblemática
de que
a luta continua
.
E há que
haver a aceitação
dessa certeza
.
porque não posso
sozinho
dinamitar a ilha de Manhattan
.
e construir uma nova
.
Aurora
.
.
IV
Garimpo solitário
a cada treva
.
o universo
e suas leis
os céus
e suas dinâmicas
o ar
e seus fogos
a terra
e suas águas
.
Depuro
elemento
por elemento
.
Estou quase cego dessa mineração
Mas ainda posso saber
Mas ainda posso alcançar
.
Só não acredito
em desígnios
de deuses
.
Minha Aurora
tem um desenho humano
traçado por mestres
de obras
.
Mas as palavras exatas
ainda fogem à minha bateia.
.
.
V
Aurora
Maria
.
Nascimento Furtado
.
– Lola
.
.
VI
Que saudades
que tenho
.
Da Aurora
.
Da minha vida
.
que Auroras
que Sol
que Vida
que nada.
.
.
VII
Eles assassinaram Aurora
.
Restou ao dia amanhecer
…………………..solitário
……………..em ruptura
…………………..radical
.
Havemos de amanhecer
.
O mundo se tingirá
E o sangue que escorre será doce
de tão necessário
para colorir tuas pálidas faces
Aurora.
Alípio Freire
escritor e jornalista
Publicado em:
“Estação Paraíso”, Ed. Expressão Popular, 2007
Alípio, sempre nos brindando com a memória que vive em nossa luta.
GostarGostar